Praticar boas acções pode mesmo actuar como uma verdadeira vitamina de realização pessoal e de saúde mental
É certo e sabido que tudo aquilo que nos dá prazer é suficiente para nos fazer sentir mais felizes. Actividades que nos dêem gozo accionam os circuitos de recompensa no cérebro e libertam hormonas da felicidade, tais como a dopamina e a ocitocina. Isto, já todos nós conhecíamos. A novidade trazida pelas neurociências assenta, agora, no facto de os actos solidários também se poderem incluir nessas actividades benfeitoras para o espírito.
Sabe-se actualmente que, do ponto de vista biológico, há recompensas intrínsecas pelo facto de ajudarmos os outros, e um dos factores intervenientes dessas mesmas recompensas são os chamados «neurónios-espelho». Porém, nem tudo se resume a estas células.
Em entrevista ao Portal da Filantropia, a professora e investigadora do ISCTE, Augusta Gaspar, que se dedica ao estudo das emoções no departamento da psicologia social, explica: «Os neurónios espelho são uma parte da equação.Efectivamente, temos neurónios espelho em muitas áreas do cérebro, ligadas não apenas ao prazer mas também à dor, ao nojo, às diversas experiências sensoriais e motoras.
O facto de observarmos os outros a praticarem o bem é um facilitador, mas não implica necessariamente que o façamos. Se ficarmos efectivamente bem dispostos com o prazer alheio, é uma experiência de empatia agradável, mas podemos ter experiências empáticas desagradáveis, com a percepção do sofrimento alheio».
Por outro lado, e tendo em conta que tudo aquilo que fazemos e que consideramos agradável ou prazeroso nos faz sentir menos stressados e mais felizes, isso também pode ser um benefício para a saúde, «baixando os nossos níveis de cortisol no sangue e restabelecendo a normalidade da nossa resposta imunitária», garante a professora.
A investigação recente tem-se debruçado sobre o modo como encaramos e lidamos com a vida e a sua influência no nosso sistema imunitário. É do senso comum que todos somos diferentes na forma como vivemos e como reagimos perante os problemas, sendo que isso se repercute no nosso bem-estar ao longo dos anos.
E desengane-se quem pensa que apenas os grandes feitos podem ser considerados benéficos ou solidários. Dar apoio à sua vizinha mais velha e carregar o pesado saco das compras ou ajudar um cego a atravessar a passadeira são actos simples, que não acarretam qualquer custo, e que nos podem fazer sentir melhor.
«Podemos retirar satisfação instrínseca de pequenos actos prosociais sem grande visibilidade no dia a dia, mas que tornam a vida mais agradável aos nossos colegas, vizinhos, amigos e familiares. O contentamento deles pode, depois, contagiar-nos», refere Augusta Gaspar.
A ocitocina é a principal responsável pela empatia. Por isso mesmo, é libertada em situações tão distintas que podem ir do amamentar ao próprio momento pós-orgasmo. Há quem lhe chame a «hormona do amor», por estar associada a momentos de intimidade ou proximidade afectiva. E tal como se aplica o efeito viral que tem o choro de um bebé para os outros bebés que estão com ele numa sala, também esta empatia se aplica em situações e causas que tocam emocionalmente as pessoas, gerando verdadeiras operações solidárias a que, espontaneamente e por contágio, muitos aderem.
Essa adesão pode mesmo ser motivada pelos próprios media e pelas redes sociais. Quantas vezes nos deparamos com pedidos de ajuda no Facebook, por exemplo? Quase diariamente. E a verdade é que, apesar de nem sempre conseguirmos contribuir, pelo menos uma «partilha» fazemos, tentando influenciar a nossa comunidade virtual.
Fazer bem faz bem quando se assume um comportamento pró-social sem esperar nada em troca, ou seja, quando praticamos o bem «sem olhar a quem». De acordo com Augusta Gaspar, as boas acções podem mesmo «conferir prestígio a quem as pratica na comunidade». E nada melhor que influenciar os outros com aquilo que fazemos de bom. Afinal de contas, não vivemos isolados… e com uma boa conduta em comunidade, só temos a ganhar.