Uma fundação é uma estrutura que perpetua a memória do seu fundador (ou algo equivalente), que a dota de capital suficiente para que possa prosseguir os seus fins. A Fundação Gulbenkian, a Fundação Champalimaud, mais recentemente a Fundação Francisco Manuel dos Santos. Mas há outras. Temos as chamadas fundações públicas, pagas apenas com […]
Uma fundação é uma estrutura que perpetua a memória do seu fundador (ou algo equivalente), que a dota de capital suficiente para que possa prosseguir os seus fins. A Fundação Gulbenkian, a Fundação Champalimaud, mais recentemente a Fundação Francisco Manuel dos Santos.
Mas há outras.
Temos as chamadas fundações públicas, pagas apenas com dinheiro do Estado para dificultar o controlo do Tribunal de Contas.
Temos também as fundações mendicantes: um generoso filantropo pratica boas acções com o dinheiro dos contribuintes.
E certas fundações que parecem ter sido criadas apenas para fugir aos impostos. Capital, pouco. Receitas, sabe-se lá. Boas intenções, em vez de boas acções.
O primeiro dever de uma fundação é ser inteiramente transparente, e hoje a transparência chama-se Internet.
O documento sobre boas práticas do Centro Português de Fundações, criado em 1993 pela Fundação Calouste Gulbenkian, a Fundação Eugénio de Almeida e a Fundação Oriente, afirma no seu princípio nº 5 (sobre a “transparência e prestação de contas”): as “fundações actuam de forma transparente e adoptam práticas exigentes de prestação de contas, podendo complementar as obrigações legais com medidas adicionais”.
No entanto, experimentem obter informação na net sobre duas fundações que têm andado nas bocas do mundo: a Fundação Figo e a Fundação Saramago e verão o que obtêm. Que capital, quais receitas? O que significa que nada podemos dizer sobre se elas cumprem ou não os fins que justificaram a sua criação.
Daqui passamos para os perigos que podem ter as fundações: além da mendicância, se tiverem o estatuto de utilidade pública, um regime fiscal privilegiado.
As receitas obtidas no exterior por não-residentes ? em especial se a residência for numa zona de baixa fiscalidade ?, se forem receitas como direitos de imagem ou direitos de autor, podem escapar quase totalmente a qualquer tributação pessoal, com taxas progressivas. Mas restam as taxas fixas, pagas por não-residentes, cobradas no país fonte do rendimento.
Aqui, uma fundação faz maravilhas: cobrindo a ganância com o manto da benemerência e das piedosas intenções temos uma estrutura que escapa à tributação e que permite uma adequada gestão de fundos numa entidade ao serviço do fundador ou seus próximos. O dinheiro passa da conta pessoal para a conta da fundação e basta fazer qualquer coisa para manter as aparências. Um esforço largamente compensado.
Os perigos destes buracos só serão controlados se a administração fiscal se convencer de que, além de verificar se as empresas enviam o IVA retido, se preocupar com este tipo de planeamento fiscal agressivo.
A lei deveria ser muito mais exigente, mas o regime actual dá à administração fiscal possibilidades de actuação.
E num momento em que o fisco vai extrair mais uns centavos àqueles milhões de contribuintes com escassos recursos e que não fazem, nem podem fazer, nenhum tipo de planeamento fiscal, esta preocupação com os tartufos fiscais é mais do que necessária. A omissão administrativa é um insulto aos contribuintes que têm de pagar.
Fiscalista J.L Saldanha Sanches